segunda-feira, 16 de março de 2015

A mídia apresenta suas armas

 
Publicado no Brasil 247

Quem acredita que os protestos foram surtos espontâneos de revolta desconhece a árdua rotina das mobilizações populares no país. Se as redes sociais bastassem para sublevar descontentes, as capitais paralisariam todo fim de semana. Reivindicações não faltam. O que falta é o apoio da imprensa corporativa a elas.

Trabalhos acadêmicos futuros mostrarão como o fenômeno de 15 de março de 2015 foi construído pelos grandes veículos. Ao longo das três semanas anteriores, canais de TV, emissoras de rádio, jornais, revistas e portais da internet uniram-se na divulgação do evento, associada a noticiário negativo sobre o governo federal.

Esse fabuloso esforço propagandístico deu visibilidade heroica a grupelhos irrelevantes da direita, que há poucos meses faziam passeatas minguadas e caricatas. Disseminou a imagem republicana dos atos, atraindo os adeptos das modas protestantes de 2013. E naturalizou ideologicamente o antipetismo no repertório moralista da classe média.

Desde a preparação do golpe militar de 1964, a imprensa brasileira não agia de maneira tão uníssona e articulada. Nas TVs e rádios, houve menções contínuas em todos os espaços de programação, incluindo chamadas sensacionalistas para coberturas ao vivo. Até astros e celebridades foram mobilizados. Nos meios impressos, primeiras páginas, colunas e reportagens dedicaram-se diariamente ao tema.

O recado que as empresas de comunicação transmitem ao governo federal é inequívoco: “eis o que podemos fazer contra nossos inimigos”. O gesto adquire oportunismo diante dos debates envolvendo o Marco Regulatório do setor, a reforma política e a taxação de grandes fortunas. E agora ganha ainda mais sentido com a descoberta do envolvimento de chefetes midiáticos na lista de contas no HSBC suíço.

Tendo em vista o porte do empreendimento, mobilizar 1% do eleitorado nacional chega a soar um tanto irrisório. Mesmo entre os 51 milhões de eleitores de Aécio Neves, uma fração mínima saiu às ruas. Claro que, na condição de promotora do espetáculo, a imprensa vai exagerar seus resultados, conferindo grandiosidades inéditas ao feito, sem esmiuçar os outros detalhes que também o tornaram único na história recente.

Mas é a simbologia do episódio que deveria preocupar o governo Dilma Rousseff. Repetindo março de 64 (e a coincidência nas datas não é casual), os agressores querem evitar que o Planalto supere a crise política através de medidas radicais que aglutinem as bases populares. Basta um leve sinal nesse sentido e a mídia joga o “apelo das ruas” sobre o Congresso, na forma do impeachment.

A mensagem é muito clara e preocupante para receber apenas discursos apaziguadores e promessas vazias. A não ser que Dilma tenha desistido de enfrentar seus adversários.

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