segunda-feira, 6 de abril de 2015

Fora todo mundo

















Publicado no Brasil 247

É típico do uso partidário do combate à corrupção dividir a sociedade entre os adeptos da cruzada saneadora e os cúmplices da roubalheira. Essa armadilha serve justamente para ocultar a instrumentalização, pela direita, da pauta da moralidade pública.

Mas o conservadorismo da bandeira anticorrupção não reside apenas no seu uso por facções políticas. A tática de acuar o governo federal visa mais do que impedi-lo de guinar à esquerda para recuperar o apoio das bases. Visa também evitar que o Planalto reivindique e incentive ações de combate ao crime para além dos domínios petistas.

A estupidez do impeachment serve à impunidade geral. A mídia endossa a ideia de afastamento de Dilma Rousseff para ofuscar a roubalheira generalizada e para que o absurdo e a inviabilidade da iniciativa golpista contaminem o debate sobre a corrupção no país.

Não é coincidência que a bobagem ganhe força junto com a descoberta de escândalos que mancham a hipocrisia moralista da direita. Sabendo que Dilma não cairá por vias legítimas, a oposição tenta enfiar seus apaniguados sob a mesma blindagem. Transformando-a em bode expiatório da pizza resultante.

Apesar da irracionalidade e do oportunismo da caça às bruxas, a esquerda comete um erro estratégico ignorando o fenômeno. O silêncio orgulhoso dos sensatos permite que os brucutus se apropriem de uma causa forte e sedutora, naturalizando a falácia de que apoiar o governo federal equivale a aceitar ilicitudes.

Os adversários da histeria, dentro e fora do governismo, fariam melhor lidando cinicamente com os cínicos. Em vez de repudiar o clima justiceiro, deveriam alimentá-lo até o paradoxo, participando das passeatas com cartazes de “Fora Alckmin”, “Fora Richa” e “Fora Serra”, e faixas sobre as contas secretas na Suíça, os mensaleiros tucanos e a máfia dos cartéis metroviários paulistas.

Aderindo ao estímulo majoritário das manifestações, o gesto não poderia ser acusado de malicioso ou ilegal. Qualquer advogado consegue uma liminar preventiva garantindo o direito de explorar o falso apartidarismo defendido pela própria liderança dos atos.

Mesmo sem autorização judicial, desde que os impertinentes se mantivessem coesos, pacíficos e imunes a provocações, os organizadores e as polícias seriam forçados a tolerar sua presença. Afinal, eles aceitam neonazistas, não aceitam?

Basta formar um bloco de míseras duas mil pessoas com camisetas da seleção, filmando cada passo, distribuindo panfletos, seduzindo populares. Depois, espalhando material nas redes sociais, causando polêmica na mídia e suscitando debates.

Aposto que a moda moralista começa a dissipar em poucas semanas.

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