A grande realização do Movimento Passe Livre foi
impor uma demanda clara e objetiva às autoridades. Os aumentos das tarifas
jamais seriam revogados sem passeatas de tamanha proporção, mas tampouco se aparecessem
originalmente misturados a outras exigências vagas e desconexas.
Os conservadores (e a mídia que os representa)
adoram lutas generalizadas: além de não se realizarem plenamente, estão fadadas
à derrota em bloco. Agendas pontuais podem ser mensuradas, fiscalizadas, sistematizadas.
São viáveis.
As revoltas difusas assimilam qualquer plataforma
negativa, inclusive as que desprezam os valores republicanos. O ativismo anti-tudo, recusando a essência negociadora da atividade política, adere ao
enfrentamento como único meio de superar a contradição insanável de quem
pretende transformar um sistema sem aderir aos seus mecanismos.
A direita não teme esses radicais. Ela os
instrumentaliza para desestabilizar seus adversários comuns no verdadeiro
front, onde as mudanças reais acontecem. Se Dilma Rousseff pudesse perder eleitoralmente
num clima de estabilidade institucional, a imprensa corporativa não teria
recebido as manifestações com a mesma alegria.
Para a oposição, tanto melhor que os partidos e
sindicatos sejam desmoralizados. Com eles desfalecem mecanismos possíveis de
ação pragmática e organizada a favor de causas palpáveis. É fácil engolir
gritos contra uma “Corrupção” anônima e nebulosa, que serve para qualquer
candidato a vereador de cidadezinha. Difícil mesmo é ter dezenas de milhares
bradando em uníssono pelo fim do voto secreto nos legislativos.
Basta um semestre de campanha televisiva para se
fabricar o novo Collor, de saia ou toga, que represente a limpeza ética pleiteada
nas ruas. Daqui a vinte anos, quando outra onda de protestos for novamente
possível, ninguém se lembrará como tudo começou.
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